"E se invadissem a sua casa?" - a pergunta que desnuda o autoritarismo e a desconexão com a realidade do STF
- Fábio Ostermann
- 16 de abr.
- 3 min de leitura

O relato da jornalista Eliane Cantanhêde na Globo News, na semana passada, sobre uma conversa de bastidor com um ministro do STF chamou minha atenção e me pareceu interessante em diversas camadas:
Vou fazer a pergunta que um ministro do Supremo sugeriu, porque eu estava tentando entender como é que o Supremo vai se comportar, e aí, esse ministro me sugeriu uma pergunta, para eu fazer uma pergunta para os parlamentares que defendem essa anistia. E a pergunta que ele me sugeriu é a seguinte: “Se invadissem a sua casa, jogassem rojões, paus e barras de ferro em seus funcionários, destruíssem os seus móveis e quisessem que o vizinho tomasse o poder e passasse a comandar a sua família e a sua residência, você pediria anistia?”. E aí ele complementa a pergunta: “Mas contra o país e a democracia, tudo bem, pode?”
Primeiramente, cabe questionar: quando normalizamos a prática de ministros do Supremo Tribunal Federal emitirem publicamente opiniões sobre diversos assuntos, especialmente sobre casos sob sua própria jurisdição? Juiz deve se manifestar nos autos, não por meio de conversas de bastidores com jornalistas. Isso é algo que qualquer estudante de Direito de primeiro ano sabe.
Em segundo lugar, os prédios invadidos não são a “casa” dos ministros, deputados ou senadores que lá trabalham. Isso precisa ser muito claro, diante da confusão entre público e privado que assola o país. Ser membro do poder não confere propriedade sobre ele, mas impõe a responsabilidade de zelar pelo bom funcionamento da instituição, lembrando sempre que ela serve ao povo brasileiro, que é o verdadeiro dono daquelas “casas” invadidas.
Em terceiro lugar, se minha residência ou local de trabalho fosse invadido, ou se qualquer direito ou liberdade minha fosse injustamente violado, não seria razoável esperar que apenas eu, com meu juízo pessoal, pudesse realizar um julgamento justo e imparcial sobre o ocorrido. Na verdade, o que esse ministro – que tenta influenciar a agenda do Congresso via imprensa – demonstra inequivocamente é sua incapacidade de julgar adequadamente os envolvidos nos eventos controversos de 8 de janeiro.Não é compatível com o Estado de Direito que uma pessoa ou instituição seja ao mesmo tempo vítima, acusadora e julgadora. Não há chance de esse julgamento ser imparcial ou justo.
É evidente que aquele episódio “não foi um passeio no parque”, como gosta de afirmar em tons de revelação Alexandre de Moraes, e que os manifestantes não tinham o direito de agir como agiram. No entanto, atribuir indiscriminadamente a todos os participantes a culpa por crimes como associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado é absurdo. O mais adequado seria enquadrar tais atos como dano ao patrimônio público – crime que, mesmo com todos os agravantes previstos no artigo 163 do Código Penal, prevê pena máxima de detenção de seis meses a três anos. Vale ressaltar que a pena de detenção, diferentemente da reclusão, implica regime inicial aberto ou semiaberto.
Assim, por mais que esse crime carregue um simbolismo gravíssimo, é injustificável - e chega ao risível, pelo absurdo da situação - que magistrados do STF caracterizem as ações daquelas pessoas em pleno domingo como uma associação criminosa armada com objetivo de executar um golpe de estado.
Os indivíduos que permanecem encarcerados (alguns há mais de dois anos!) em regime fechado já cumpriram muito além da pena proporcional e razoável para os delitos cometidos. Nesse contexto, a reivindicação por anistia não parece descabida. O ideal seria a denúncia individualizada de cada envolvido e o julgamento específico de cada réu, com dosimetria adequada conforme a gravidade de seus atos. Considerando que os crimes ocorreram em locais amplamente monitorados por câmeras (Congresso e STF), e onde os participantes não demonstraram qualquer preocupação em ocultar seus rastros, seria perfeitamente viável conduzir uma investigação abrangente que preservasse a justiça e garantisse a punição apropriada dos responsáveis.
Contudo, o STF optou pelo caminho da vingança. Ao tentarem punir Bolsonaro e aqueles que o seguem, os membros da suprema corte acabam por prejudicar as instituições brasileiras e comprometer gravemente a credibilidade de suas ações. É lamentável observar aqueles que deveriam proteger a Justiça e nossas instituições trabalham com afinco para desacreditar a imparcialidade do poder judiciário e deteriorar ainda mais o já fragilizado senso de justiça no Brasil.
Nesse ritmo, não serão necessários "um cabo nem um soldado" para destruir nossa democracia. Bastará um ministro exercendo poderes absolutos e outros dez sendo coniventes.
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